Meu melhor amigo é o barco
Foto créditos: CBR/Dikran Sahagian
Por Carlos Ariosto Tinga da Silva
Novamente cheguei de forma anônima ao Rio de Janeiro. Fazia tempo que eu não assistia a uma Regata na Lagoa Rodrigo de Freitas, agora ainda mais famosa, após a Rio 2016. O Campeonato Brasileiro de Barcos Longos, me soou um pouco estranho, ainda não me acostumei a grande quantidade de categorias de idades que as Regatas são disputadas hoje em dia.
Eu sei que temos que nos modernizar, mas é muito estranho para mim, dizer que um Double Skiff é um barco longo, mas me explicaram que os barcos curtos são o Single Skiff e o Dois Sem Timoneiro, logo, todos os demais são considerados longos, ou seja, o Double e o Four Skiff, da palamenta dupla, Quatro Sem Timoneiro e Oito, da palamenta simples ou barcos com remo de ponta.
Confesso, que eu gosto mais dos barcos com remo de ponta, cada remador utiliza apenas um remo. Parece que a técnica é mais difícil, tal qual a sincronização da guarnição, mas os barcos de palamenta dupla, também tem uma simetria admirável de se ver.
Vi que o Remo se modificou um pouco, neste campeonato houve igualdade de gênero, as mesmas provas disputadas pelos homens, foram disputadas pelas mulheres. Um avanço para o esporte.
Conforme já falei, antes tudo era júnior ou sênior, também chamada de classe aberta. Hoje, existe a categoria Sub23, para dar mais tempo ao Júnior, a fim de ter uma transição melhor para a categoria Senior. Também existe a categoria Peso Leve, assim os Remadores privilegiados em altura e peso, disputam entre si com mais igualdade, e os demais atletas, com estatura menor, mais próxima a média da população, perfazem provas mais disputadas.
Ao final, o que a torcida quer, é disputa, tão bem salientada pelo narrador oficial do evento e multi campeão, Gibran Cunha, quando mais apertada é a prova, mais se vibra, mais se torce, e o sabor de quem vence, é ainda maior.
A quantidade de provas que os atletas participam me chamou a atenção, antes chamávamos de “dobra”, pelo fato de ser duas provas. As famosas dobras, quatro com e oito, para os juniores, pois se tinha duas horas de intervalo, aos seniores conseguiam fazer a dobra quatro com e dois com, onde o intervalo era apenas de uma hora, para aqueles casca grossa, mas neste campeonato, vi muitos atletas saindo de um barco e já entrando noutro, várias vezes. Como estou apenas na torcida, fiquei a pensar se temos provas demais ou poucos atletas.
Eu resolvi escrever este outro texto, porque na outra vez, eu estava um pouco receoso, talvez a timidez fosse maior do que a minha vontade de contar as minhas histórias, ou até mesmo receio de não ter o meu texto publicado, ou pior ainda, que as pessoas que lessem, não gostassem ou não entendessem. Joguei a camiseta da timidez no cesto e abri o peito novamente, para deixar estas palavras que estavam guardadas no meu coração, há tanto tempo manchar o papel virtual da tela.
É impossível assistir a estas competições e não me emocionar. Do mesmo modo, é impossível ver estes dedicados jovens competindo entre si, suando sangue, e não relembrar como era árduo nosso treinamento. Meses resolvidos em apenas minutos numa regata, e nem sempre o saldo da equação, resultado obtido versus nível de treinamento, era positivo.
Aprendi remando, ao final de tudo, o que realmente importa é o barco. Ele é o meu melhor amigo, me diz de forma sincera e impessoal, sem ofensas, com toda a educação possível, se eu o trato bem. Ele é autêntico e verídico, se aplico a força necessária, no momento certo, na direção certa, ele se desenvolve, desliza sobre a água com graça e fluidez.
Quando escrevo que ele me diz, realmente ele fala comigo, através do som que emite quando se desloca sobre a água. Quando a guarnição está remando em conjunto, soa como música, com ritmo e harmonia. Temos que treinar nossos ouvidos para distinguir este som, e não podemos nos enganar, achando que quando o vento está contra, pensar que o barco está andando mais rápido, mas este é um detalhe que somente na prática, conseguimos aprimorar.
O barco é soberano sobre nós. É ele que dita as normas, a voga que devemos remar, a força que devemos aplicar, mas quem aplica a força e faz a voga aumentar se não nós remadores?
7 comentário
Acácio Mund Carreirão · 26 de outubro de 2022 às 22:07
Ótimo texto, Seara! Excelente reflexão no final, ao traçar um paralelo da importância do barco e a dos remadores.
historiasderemador · 26 de outubro de 2022 às 22:11
Carlos Ariosto escreve muito bem!
Joaquim Ameba · 26 de outubro de 2022 às 22:57
Ariosto nasceu e se criou na crônica, tal qual personagem de Isaac Asimov.
Gibran Cunha · 27 de outubro de 2022 às 17:33
Excelente crônica. É a síntese do remador pela ótica do remador. Valeu
historiasderemador · 14 de novembro de 2022 às 11:57
Carlos Ariosto é um remador sem rosto, mas com muita paixão pelo esporte. Ainda contará muita coisa, pelo menos é o que nos prometeu.
Adriana · 14 de novembro de 2022 às 11:32
Descrição perfeita! Que belo texto!
historiasderemador · 14 de novembro de 2022 às 11:56
Em nome do Carlos Ariosto, agradecemos.