Vai Madeirão

Publicado por historiasderemador em

Por Cesar Seara Neto

Quando somos jovens, os finais de semana começam sexta-feira a noite, sendo nossa preocupação, saber onde ocorrem as baladas mais disputadas, onde seremos mais vistos e mais pessoas para ver. Se trabalhamos sábado de manhã, isto não nos impede de ver o sol nascer, um café forte e um banho limpa toda a ressaca que por ventura pretenda se instalar.

No meu caso, com cinquenta e sete anos, o fim de semana também começa na sexta-feira, porém no turno da tarde. Enquanto jovens estão a cata de agito, eu estava procurando no Atacadão, preços acessíveis para o salchipão do sábado. Aqui em Porto Alegre, a linguiça do churrasco é chamada de salsichão, dentro do pão vira uma refeição. Para um remador, um lanchinho. Carvão, refrigerante, pão encomendado no armazém, maionese, mostarda e ketchup fecharam o cardápio.

Sábado passado, às sete horas da manhã, quatro barcos a Oito com atletas do GPA, alinharam na marca dos Oito mil metros estabelecida pelo Prof. João, pouco antes da entrada do Canal do Lage. As guarnições foram escaladas de acordo com o desempenho, gênero e idade dos atletas. Os handicaps foram estabelecidos obedecendo um confronto matricial, idade e potência, alimentando as elaboradas planilhas do Coach.

Embora tenha sido um confronto interno, a ansiedade era grande. A gritaria era maior ainda, antes mesmo da abertura das portas do galpão às seis horas da manhã. Baixa remo, barco, verifica as baterias dos alto falantes, garrafas d’água, contadores de voga. Sobe o rio, oito quilômetros e uns quebrados, ensaiando as trocas das duplas.

Este era o desafio, seis pessoas remando enquanto uma dupla diferente a cada cinco minutos, segurava os remos e equilibrava o barco. Parece ser fácil, mas remar esta distância nesta configuração, é pesado. A outra regra do desafio era voga máxima de trinta remadas por minuto.

Relembrando o saudoso Germano Schulz que nos deixou há pouco tempo, certa vez escrevi um texto quando remei na guarnição do Júpiter. Ele me perguntou se poderia me dar uma sugestão. Supliquei para que me desse.

– Você deveria escrever o nome das pessoas.

Seguindo seus conselhos, vai a escalação do nosso barco. Da voga para a proa: Ana Vida, Seara Neto (euzinho), Mario, Tarta, Contu, Ronaldo, Zé Paulo e Paula, no timão deitado na proa do Madeirão, Nico.

Terminamos de subir o rio, o dia já estava claro. As guarnições mais jovens saíram depois, mas tal qual Vikings avançando contra territórios alheios, se aproximavam remada a remada, devorando o rio com o nível d’água mais alto que o normal. Nossa ansiedade aumentava na mesma proporção que diminuía a distância que nos separava.

Nossa guarnição foi a que largou primeiro. Minutos depois as demais. Sob os comandos do nosso timoneiro, aproveitamos para ganhar distância enquanto nossos concorrentes aguardavam o comando de partida.

Após trinta remadas iniciais com bastante vigor, o tuc-tuc forte dentro do meu peito, a respiração parecendo não ser suficiente, pensei na famosa frase: Eu vou morrer. A verdade, é que passado o susto inicial, o combate aperta, mas a vontade de fazer força aumenta de acordo com a adrenalina da prova. Eu posso até morrer, mas será após a linha de chegada.

Eu imaginei que seríamos alcançados no último quilometro do pega, mas isto não foi bem combinado com os adversários. As duas guarnições mais novas, desceram se carneando, sendo esta disputa, quase uma regata dentro da outra. Os comandos de quero vinte remadas fortes, caramba! eram ouvidos até mesmo pelos peixes submersos.

Toda esta narrativa se tornou ainda melhor, quando às oito e trinta em ponto, desceram do táxi moderno chamado por aplicativo, meu pai e minha esposa. Moacir no comando do tonel cortado ao meio, assava as linguiças e filas organizadas a esmo, se formavam para saciar a fome infinita de remadores vorazes.

Mostrei o Clube para o meu pai, registros fotográficos nas paredes, barcos, algumas histórias. Coube a ele se misturar à turma, sentado numa cadeira com as pernas ao sol e relembrar alguns bons momentos que vivemos neste esporte tão belo.

Seus aforismos e máximas sempre repercutem na minha memória, e desta vez ele me brindou com mais uma experiencia que ele levou oitenta e um anos aprendendo:

A juventude é temporária, a velhice, definitiva.

Aguardo ansioso pela transmissão que faremos do evento realizado pela REMOSUL, neste sábado, 29 de julho às 14 horas no Shopping Praia de Belas, Porto Alegre, ocorrerá a Regata de Remo Indoor – REGARI 2023. Assista ao vivo aqui neste link.


4 comentário

Renato Lisbôa Müller · 28 de julho de 2023 às 21:56

“Quero vinte remadas fortes”! Só vinte? E por acaso, antes desta ordem, os remadores não estavam fazendo força? Como timoneiro que fui, eu me identifiquei com está fala….

    historiasderemador · 31 de julho de 2023 às 11:53

    Tu sabes que o timoneiro é um mágico que descobre onde estão as forças do remador!

Joaquim Ameba · 28 de julho de 2023 às 23:06

O Searão, querendo ou não, citou o Millôr.

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