Um remador de paletó e gravata

Conheci o Gilberto Gerhardt como o arquiteto, que adorava usar paletó e gravata. Fazíamos parte de uma equipe voltada para projetos estruturais nas unidades de conservação federais no RS. Éramos 5 numa sala, e eu atuava como desenhista cartográfico e arquitetônico. Os projetos ou eram dele ou do Fitareli.
Naquele tempo não sabia que ele havia sido ou era um grande remador. A pessoa que conhecia era outra, assim como todos somos outros quando estamos a trabalho. Mas Gilberto era um falador de sua história, de menino acompanhando o pai em viagens de caminhão, do homem caseiro de final de semana e pai de dois filhos. A voz rouca e forte, mas a pessoa em si tinha um riso solto, que parecia que iria se engasgar, mas logo engatava outro riso… Se este era o lado risonho; o lado sério, era um franzir de sobrancelhas, o olhar miúdo, e um pequeno morder do lábio inferior. O corpanzil surgia, ombros altos, e a voz vinha seguida do dedo em riste.
Daí passado um tempo foi-se para Vitória.
1992, dez anos se passaram, e nos reencontramos em Vitória. Agora sabia que era remador, que remava inclusive com pessoas importantes da vida pública da cidade, mas como sempre para ele, eram remadores. Como deveria ser. O Álvares Cabral era bem perto de onde trabalhávamos. Era seu ponto de saída. Ele ia remar e eu ir vê-lo. Os amigos eram todos próximos. Os meus eram da área da saúde. Mas o grupo era um só.
Na semana, no dia a dia, o Gilberto era o de sempre: paletó e gravata. Viajávamos mais ao interior. Projetos. Novas moradias. Mas ainda o tema era o mesmo. Unidades de Conservação. Desta vez, fui embora antes dele. Mas fiquei sabendo que agora era Educador Ambiental e era do grupo de prevenção a incêndios florestais. Caminhos diferentes, mas passamos pelos mesmos projetos. Certa vez fui conferir o trabalho dele como coordenador de projeto em Augusto Ruschi. Disse-lhe para ter cuidados, pois os beija-flores, adoram homens de paletó e gravata.
2022. Mais 10 anos. Rio de Janeiro, Lagoa Rodrigo de Freitas. Ele andando com a querida Lúcia. E eu gritando dentro da barraca de camisetas: “Que porra de gaúcho que nada! O cara tirou o paletó”. E o sorriso entrou na barraca, com olhar de surpresa, e aquele grande sorriso, a voz mais rouca, querendo saber o que fazíamos ali… Agora aposentado. Árbitro do Remo. Master. Estávamos novamente falando do tempo, e agora falando de remo…
1982 era um ano diferente. Nossos contatos eram mais de pranchetas, com poucas viagens. Nem sabia do remo. Nem de que havia sido campeão (panamericano). Nem qual clube frequentava. Passados os anos, quase 10, nos reencontramos em Vitória. E ainda o mesmo. Chamava-o de “menino do terno”. Risos. Reencontro fascinante. O sorriso e o semblante eram mais jovens. A risada ainda era a mesma. E agora sabia que remava no Álvares Cabral.
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