Charles, o Nêgo

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Por Cesar Seara Neto

Eu estava sentado sozinho na sala, ao final da tarde de domingo, quando li a mensagem do Mesquita informando que o Charles não estava mais conosco neste plano terreno. Fiquei imóvel olhando para a tela do telefone, buscando uma explicação daquilo que não se explica, apenas se aceita. Mas é difícil aceitar.

Rapidamente fiz um retrocesso na minha curta vida de atleta de remo que se iniciou no ano de mil novecentos e oitenta. Foi somente no ano seguinte que me aproximei do Nêgo, assim chamado pelo seu fiel amigo Mesquita. Eles remavam um dois sem timoneiro, “os Panguinhas”. Hugo e eu passamos a remar dois sem também. Treinamos juntos algumas vezes, e dois rachas aconteceram. A saída era no Veleiros da Ilha. Eram chamados de “pegas”. Eles ganharam um, nós ganhamos o outro. Nunca houve outro para o desempate. Nunca mais haverá.

Lembro quando ele atingiu a maioridade e apareceu com uma moto cento e vinte e cinco, motor dois tempos. Ele usava um óleo especial na mistura com o combustível, pois a fumaça era mais branca, e o cheiro, segundo ele, uma maravilha. Para mim fedia tanto quanto sua camisa do Colégio Aderbal, que ficou bege de tanto treinar com ela.

Certa vez, mesmo com cadeados e correntes nas rodas, erguemos a moto estacionada a frente da garagem do Aldo Luz, escondendo-a muitos metros distante de onde estava. O Nêgo era gago somente quando ficava ansioso ou nervoso. Ele sempre estava assim. Quando retornou do treino, a primeira coisa que fez ao chegar com o barco na praia, foi olhar para a parede vazia e não enxergar sua moto. Saiu correndo. Sapateava. Levava as mãos à cabeça. Sabia no fundo, que aquilo era obra nossa. Talvez o Mesquita fizesse parte do conluio.

O Nêgo era assim, mesmo com todas as traquinagens que fazíamos com ele, sempre estava pronto para abraçar os amigos e dar boas risadas. Mas seu coração bom com todos, nos traiu sem nos dar chance, deixando um vácuo inexplicável.

Encerro com esta singela homenagem que fiz ao amigo em 18 de julho de 2021, quando venceu de forma convincente o Desafio de Remo Indoor realizado pela Confederação Brasileira de Remo, basta clicar no link a seguir.

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Categorias: Crônicas

12 comentário

Renata · 2 de agosto de 2025 às 19:42

Parabens pelo texto Seara, triste perder um amigo, um companheiro de esporte, triste saber da morte de alguém com menos de 100 anos…sim, porque certas pessoas deveriam durar no mínimo um século, para atravessarem gerações perpetuando sua sabedoria…Charles foi remar em outro universo, viajar pelas galáxias em sua 125, cuspindo fumaça branca pela via láctea.

Renato Müller · 2 de agosto de 2025 às 20:28

O Charles foi meu adversário no início da década de 80. Depois, estivemos juntos, no Riachuelo. Ás vezes, ele perguntava se eu havia visto a guarnição treinando, pois queria saber o que poderia ser melhorado. Depois, ele retornou para o Aldo Luz. Um figuraço!
Faz parte da história do remo catarinense.

Paulo Damian (titia) · 2 de agosto de 2025 às 22:28

Muito triste com a passagem de nosso amigo!!😥😥😥

Sandra Berber · 3 de agosto de 2025 às 00:18

O Charles foi um remador que fez história no Clube de Regatas Aldo Luz, não só por suas conquistas no Remo, mas pelo seu grande coração e sua alegria. Valorizando as amizades que conquistou com seu carisma e gentileza. Deixou saudade!

Paulo Roberto · 3 de agosto de 2025 às 06:08

Uma unanimidade, uma figurinha ‘daquelas carimbadas’, vc lembrou de apenas uma passagem, com ele… agora pense: Tm remadores reunidos ao seu redor foi uma história atrás da outra, velório carregado de sentimentos, mas com o Bunda, Nego, presente, o riso tbm estava conosco.

Ricardo Diefenthaeler · 3 de agosto de 2025 às 08:13

Bela homenagem, Seara!

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